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agalma

talvez a emoção que menos estimule o poeta seja a alegria, tão breve e rara de sentir

talvez a emoção que menos estimule o poeta seja a alegria, tão breve e rara de sentir

páginas soltas

 páginas soltas.jpg

pintura a óleo, Rui Couto 

 

são muitas as páginas soltas. Nem todas se conseguem entender, por vezes veem-se letras que não formam nenhuma palavra, alguns rabiscos de desenhos, pedaços de vivências ou fantasias, sem contexto, desgarradas, tanto se podem referir ao passado como ao presente, não interessa para as emoções que relatam ou que fazem sentir a quem as lê. Vividas ou sonhadas, qual é a diferença e o que é mais reconfortante?

Mas a curiosidade é quase sempre maior que o benefício e comecei a ler o que apanhava.

Vi uma carta de uma mãe para a filha, sua única filha. O seu presente abençoado. Um foco de luz que lhe iluminou todo o caminho. É pesado receber assim tanto amor, a filha rebela-se, contesta, quase sufoca, mas sabe e sente esse grande amor que a envolve. E a mãe conta, uma vez mais, como era quando nasceu, a beleza e a alegria enquanto ia crescendo, os passinhos, os sorrisos, as papas, os sonos e as manhãs. A mãe vai-se lembrando e escrevendo. Lembra-se de tanta coisa que não tem importância nenhuma, mas vai-se lembrando e escrevendo. Só uma outra mãe poderá querer ler esta página.

Vi uma outra que começava com um S grande e perfeito. Era uma página bonita desenhada com balões, nuvens e muito mar, mas quando começei a ler veio um sopro de vento e lá foi a folha. Intrigada larguei tudo o que tinha nas mãos e fui atrás dela. Apanhei-a e encantou-me o que começei a ler. Sei que a minha realidade são os meus sonhos e isso é mais real do que a chuva que molha a minha roupa .. e voou outra vez. Não valia a pena tentar agarrá-la de novo, era um S de sonho, era uma página com asas.

O livro do silêncio, Sara Maitland

gostei muito de ler este livro em registo autobiográfico e de uma autenticidade contagiante. Senti-me tão em consonância que reflectia com ela nos vários tipos de silêncio e na necessidade que me é tão familiar da contemplação sem ruídos. Ela confronta o que sente com relatos de pessoas que fizeram experiências semelhantes, integrando a religião e o contexto cultural. Sempre lúcida e empenhada – embora sem certezas – vai assumindo o que não lhe interessa, muda de ambientes, analisa novas sensações e vai ficando mais certa do que procura.

É uma escritora e, por isso, precisa de um pouco de sol na eira e de chuva no nabal, porque o esvaziamento do eu tão necessário à ligação com a natureza – que privilegia e que pratica, deixando cair e diluir interesses, desejos e glórias– diminui-lhe o investimento em si própria, no enriquecimento da confiança, imaginação e entusiasmo, tão importantes para ao acto de criar, e de viver, digo eu.

Mas é sempre nas escolhas que nos fortalecemos e conseguiu o equilíbrio que procurava. Uma boa companhia.

dos meus olhos

caiem dores, culpas, e um desânimo que não encontra margens

pelo meu pai, pela minha mãe

por tanto que lhes quero e

por de tão pouco lhes valer.

A velhice é um nó cego

e eu sinto-me atada de mãos, a olhar

gostaria de ter sabedoria para entender que a vida é assim. Mas dói-me tanto

Equilíbrio em tempo incerto

Equílibrio em tempo incerto.jpg

 pintura a óleo, Rui Couto

 

Compreendo a raiva, o desgosto e a decepção

A inércia, a falta de ânimo

Mas não compreendo a violência de nenhuma forma, é irracional e primária. A existência de guerras e a fome em tantos países com déspotas ganaciosos ou ladrões de pacotilha negam a nossa pretensão de evolução.

Acredito que, se respeitarmos o que nos tem sido dado pelo conhecimento científico, cultural e espiritual ao longo do tempo, o saldo entre a harmonia e a violência poderá não ser nulo – embora devesse -, mas será reduzido. E é a partir deste patamar que temos de subir, o desafio é promover o equilíbrio, sempre orientado para a paz e a justiça, em termos abrangentes claro, porque não é possível alargar muito o zoom.

Ainda assim, gosto e vivo de utopias

A violência é uma incapacidade

Gosto de Ghandi.

a beleza americana

a beleza americana.jpg

pintura a óleo, Rui Couto

 

Vivemos num ambiente atraente onde se vende a ideia de que é possível obter o que quer que seja desde que tenhamos objectivos e determinação suficientes.

Parece fácil e sem nódoas viver numa sociedade assim, só que o caminho é muito difícil de fazer para quem quer viver com dignidade. A receita do sucesso fácil e garantido é o servilismo, a anuência permanente, o dizer que sim quando se pensa que não, o andar de cócoras na vida, sem respeito pelos valores que honram a nossa condição humana e que são determinantes niveladores da qualidade de qualquer civilização.

Mas não há só uma estrada. Se não nos preocuparmos em demasia com o dinheiro - para além do que é necessário para garantir os nossos níveis de sobrevivência física e cultural -podemos seguir pelas veredas. Fazemos o mesmo caminho mas demoramo-nos mais no percurso, e, vamos tendo tempo para absorver a delicadeza das pequenas coisas.

Sabemos que a beleza se impõe por si própria, por seu mérito, porque é bom olhar para pessoas bonitas, quadros bem conseguidos, ouvir músicas celestiais, saborear paisagens que nos sintonizam com a natureza ou, que pela sua exuberância, nos acendem curiosidades, mas para além do óbvio, comove-me a beleza que adivinho ou sonho.

esta noite fui dançar

a noite passada vesti um vestido bonito, pintei os lábios e os olhos e com um casacão largo saí de casa para ir dançar. Senti-me com poder, bordada de alegria, muito longe da apatia dos últimos dias. Mas não se pode confiar na alegria, é uma borboleta maluca, chega perto, parece que fica, estendemos a mão e ala que já foi, é uma doida que nunca se demora.

Ainda assim, fui e dançei. O ambiente era calmo e a música bonita lavou-me a alma. O corpo doía-me, mas soube-me bem.

 

Elegia

 

 

Quem te deu coragem para olhar assim a vida

Com tanta serenidade e orgulho?

A seara que trazes na alma

Ou o teu rosto encaixado nas costas do bebe

Numa comunhão perfeita?

Tens razão, a vida vai ser bela

 

elegia.jpg

 pintura a óleo, Rui Couto

 

da lucidez

quantas gaivotas em terra são precisas para se dizer que aí vem tempestade?

quantas vezes são contadas a indiferença e o desamor para acreditarmos que não nos querem?

quantos sorrisos conformistas temos de fazer para fingir que somos felizes?

e de quantos silêncios é feita a nossa independência?

se tudo acaba em que temos que nos bastar, então sejamos livres e corajosos no caminho

sem seduções

reduzindo necessidades, agradando sem reembolso, tal como respiramos

é aqui que quase tudo acontece, na nossa imensa necessidade de amor

fazemos piruetas, danças, saltos e volteios para que olhem para nós

fragilizamo-nos para que vejam a nossa sensibilidade, mostramos feridas a curar ao ar para que acreditem nas nossas forças

somos tão programados

é tão pequena a margem de manobra

mas, e por isso mesmo, é por aí que nos distinguimos.

Assim, em consciência, e num golpe de asa aluado deixamos a realidade em descanso para entramos, de novo, numa promessa de inocência.

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