Depois de ter lido, há cerca de dois anos, Sapiens-História Breve da Humanidade, acabei de ler Homo Deus.
São arrasadores estes dois livros, pela inteligência, conhecimento, capacidade de esquematização e pela distância a que se coloca para falar de nós, ele incluído, com tamanha objectividade. Mas são também de arrepio, mais o que fala sobre o futuro, claro.
Parece, e é, um atlas da nossa condição.
Tudo demonstrável, físico. Algoritmos orgânicos e informáticos, ressonâncias, reacções à música criada por um programa que se especializou em imitar Bach, e mais tarde, Beethoven, Chopin, Rachmaninoff e Stravinsky, sem que a maioria dos eruditos conseguisse distingui-los. Assustador. Monta e desmonta a possibilidade do fim do liberalismo e da consequente desvalorização do individuo, comprovando a facilidade com que poderemos ser substituídos nas estruturas que conhecemos e que nos têm justificado. Teorias que parecem sustentáveis, tanto mais que temos assistido, em grande velocidade, à substituição do homem por máquinas em muitas tarefas.
Apesar de interessantíssimo e actual, não é fácil encaixar tantos pressupostos apenas com explicações cientificas de hormonas e elementos bioquímicos, até porque pensamos logo em emoções, entusiasmos, projectos e esperanças que sentimos e, muito embora o autor assuma o enorme oceano ainda desconhecido relativamente à mente, lembramo-nos como o mesmo facto é vivido por pessoas diferentes, cada ser faz a sua realidade. Aviva-nos, de caminho, para as necessidades em que temos de reflectir como sociedade e como cidadãos. As alterações climáticas, as balizas das democracias, a insuficiência de trabalho para todos, o prolongamento da vida em condição frágil e idosa e os avanços da ciência e da indústria.
Cito uma frase do final do livro: Hoje, ter poder equivale a saber aquilo que devemos ignorar. Cuidado que, quanto a mim, já não é novo.
Do tanto que aprendi e em que reflecti com estes dois livros, ficou a certeza que quando voltar a pensar em certos assuntos serei menos ingénua, guardando e aumentando, no entanto, o lugar do sonho.
Foi o primeiro livro que li deste escritor israelita. Sabe sempre tão bem a boa escrita, gostei muito. Fiquei a saber que é um dos dirigentes do movimento para as negociações com os Palestinianos, Paz Agora.
Será, com toda a certeza, muito difícil viver em Israel com a chaga aberta da demorada guerra entre vizinhos. Como em tantos outros cantos do mundo. Para quem sente esta injustiça é doloroso absorver os privilégios sem pensar na carência de outros. É neste contexto que acompanhamos a vida de Fima, homem sensível, inteligente, preocupado e risível, com sonhos tão humanos e inalcançáveis.
Dantes não acreditava, mas hoje sei que existem pessoas que assumem que merecem tudo, apesar de não saberem o que deveria caber aos outros. A má distribuição da riqueza dói. Mas a impotência também.
E depois existe o humor. Para lidar com situações difíceis de controlar ou intervir.
O filme começa com um ambiente tecnológico moderno, focado no sucesso e no ego. A facilidade com que se compõe, na mesma fotografia, três temperaturas da cor do céu, desde o nascer ao pôr do sol, estende-se à vida. Desde compromissos, encontros e desvarios. O improvável fica a um passo. Até.
Até ao encontro com a possibilidade de acidente em que a morte é fotografada. A partir daí muita coisa muda.
O equilíbrio tão frágil entre vida e morte é tão fino e óbvio que passa a ser mais honrado. Filosóficos os diálogos com conceitos irrefutáveis tanto para a vida como para a morte, defendida pela própria, que quer ser aceite sem revolta ou indignação. Dispensáveis, digo eu, as imagens das Catacumbas dos Capuchinhos, Sicília.
Quente é o embalo da excelente banda sonora que nos leva de passeio pelas velhas e belas ruas de Palermo.
Enquanto isto, lembro-me das palavras de Ruy Belo, vim para a vida e deram-me dias.