o vírus da solidão
as dores de corpo foram sempre acompanhadas com as da alma, se não do próprio doeram a quem os ama, e tantas vezes com uma dor de alma dá-se cabo do corpo. Todos sabemos.
Esta pandemia sabe de desgraças. Da lepra, da peste negra, da asiática, da gripe espanhola e de tantas outras que têm sacudido pessoas em todos os tempos. Sabe de terramotos e de incêndios. Sabe da pobreza.
Tenho-me lembrado do que ouvi na escola, em miúda, sobre a inauguração do Titanic. Dizia o comandante John Smith Even God himself couldn’t sink this ship, tal era a confiança na engenharia e materiais usados na sua construção. Como se deu o naufrágio todos conhecemos a história. Dá que pensar, aliás a vida dá sempre que pensar.
É mirabolante o que estamos a viver. Pessoas de idade impedidas de tentar enganar a angústia com os filhos, netos, primos ou amigos. Os internados, por doença ou em lares, não podem recolher força das mãos da família. Os mais novos com empregos e filhos para tratar, comida, banhos, roupa e brincadeiras, mantendo a crença no futuro. As crianças também veem muito ameaçado o que há um mês e tal era terreno seguro.
Andamos todos no learning by doing. E há muita gente a fazer com força e sentido o que tem de ser feito, que é seguir em frente, com precaução e inteligência. Temos tido liderança com firmeza e com humanidade, embora as consequências já se adivinhem, como é costume, arrasadoras para os mais pobres e frágeis. Ainda que compreendendo, é difícil encaixar tanta distância e solidão.
Vamos ver se quando nos pudermos tocar, beijar e abraçar nos iremos lembrar dos dedos doridos da lixivia, que já vão ficando deformados por não se entrelaçarem em dedos amados e distantes.